IMPÉRIO
Além do Flávio Império Arquiteto, cenógrafo, professor, ilustrador, tem o dos quadros. Não diremos que é um pintor. Os últimos quadros revelam mais o homem de teatro e dão a impressão que sempre cria a idéia de pressão que vem do lado de lá, para quem, como observador, está do lado de cá. Aí é que está toda a metafísica do mundo tão físico que Flávio apresenta. Por esse excesso de presença no presente, o passado se corporifica e se enrijece. Daí o sentido tão diferente como solução aos diferentes nexos dentro da falta de nexo do mundo presente. Penso no desejo de estabelecer ligações; nos recursos da lucidez de estar presente no futuro mais distante e no passado mais envelhecido; nessa presença de todos e de tudo ao mesmo instante.
Nisto lembramos Fernando Pessoa quando escrevia:
"Tudo é do outro lado,
No que há e no que penso.
Nem há ramo agitado
Que o céu não seja imenso
Confunde-se o que existe
Com o que durmo e sou.
Não sinto, não sou trsite,
Mas triste é o que estou"
Pois está idéia do outro lado, do além que pressiona o lado de cá, e que procura impressionar e aterrorizar, nada mais é do que outra idéia que estando do lado de lá se corporifica para chegar até o lado de cá e pressionar, para exigir dos presentes atenção à presença dos ausentes. Assim, entre coisas tão distantes, está a matéria como energia disposta a romper uma estrutura. Nos trabalhos de Flávio ela se apresenta minuciosamente estruturada, com centenas de liames sutis. Examinando em pormenores, sentimos a presença de algo implacável, como um rastro denunciador. Mas sentimos um esforço meticuloso que nos lembra Gulliver prisioneiro. Isto nada aniquila, nem nada quer aniquilar, inclusive as novas necessidades de de criar linguagem. Apenas mostra como novidade uma situação "clichê, uma vez que todos os "clichês"da situação já não tem novidade. É por essa falta de novo que temos o caráter velho da novidade. E isso é muito, para não dizer demais, porque simplesmente se apresenta. É uma intriga, armada para o teatro, como peça bem ensaiada e bem marcada. Trata-se como se vê, de uma "mise-en-scène" concebida por um cenógrafo à procura de um autor. E, no mundo de hoje não raro, o cenógrafo se confunde com o arquiteto ao qual empresta a capacidade de montagem.
Porém, o arquiteto ilustra o cenógrafo e mostra que para as novas montagens não é necessário um autor. Basta apenas os autores que há muito representam até sem cenário.
FLÁVIO MOTTA