PINTURA - ANOS 1980

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    Flávio Império, trecho de um texto escrito para a exposição na galeria Oscar Seraphico, Brasília, 1980.

    © Flávio Império

    (...) Assim foi toda a minha educação. Primorosos cuidados da família em me colocar nos melhores colégios de então... fiz até faculdade! Sou doutor. Coisa de classe média que tem pavores de ter um filho artista. Mas esses cuidados todos de nada adiantaram. Nunca consegui produzir o "útil". Só o inútil gesto de me sentir livre e procurar a expressão mais direta do universo interior, feito criança.

    Ora! direis!

    Mas cada quadro é tão diferente do outro!!! Nunca vão reconhecer que eu tenho um "flávio império»! (Por isso assino grande, fiquem descansados).

    Essa exposição parece mais uma "coletiva" que uma "individual"...

    É, esse sou eu. Um coletivo de mim mesmo.

    -Você não tem estilo?

    - Não, nunca consegui. Até que desisti definitivamente.

    Sou um pintor sem estilo único. Mas com muitos "estilos” próprios. - Isso não baratina a cuca do teu público?

    - Se ele for viciado em "vernissages" sim. Mas se gosta e entende de pintura, não. Porque eu gosto e entendo de pintura. Como Caetano e Gil entendem de música. Seus discos e shows não são meras repetições. São seus múltiplos aspectos tratados como melhor convém a cada caso. Bethânia, por exemplo, é mil personagens em um só personagem. O que liga toda a criação é um fio interior e pouco evidente. São as vibrações do inconsciente, um jeito muito próprio de irradiar seu ponto de luz, o brilho próprio do seu astro agente. Sem os limites de u ma imagem de fora para dentro que te diga - és assim!

    Sou assim e também assado.

    Em cada quadro que pinto sou mais eu, com grande sintonia. Existe alguém que é o mesmo a cada dia?

    - Você não seleciona direito, mistura os muitos assuntos.

    - Diria: procuro a unidade dentro de mim. Se é que existe. Mudo muito de humor ao ler cada página do jornal do dia a dia. E a minha jornada é a mais íntima moradia. Meus quadros, ousaria, são como as minhas janelas. Por elas deixo entrar a luz do dia. E o dia varia. E cada um tem sua luz própria e sua própria temperatura. Nuns tem greve, noutros baixaria. Como saber qual carga a gente pega ao tomar do pincel, lápis, ou tinta. E o artista, me desculpem o excesso de pedagogia, é um “meio" através do qual muito do que há entre o céu e a terra passa, além do além que possa sonhar sua vã filosofia.

    Diria. Me sinto menos pintor e mais comunicólogo. Metalinguista. Embora possa parecer excesso de cuidado comigo mesmo.

    Eu acho é muito arriscado.

    Mas, que fazer, é o melhor que posso. Que sei. Que faço.

    FLÁVIO IMPÉRIO

    PINTURA - ANOS 1980