O MELHOR JUIZ, O REI
(1963)

X
  • DEPOIMENTOS (1/1)
  •  
    X
     
    Programa do espetáculo

    © Flávio Império

    UMA BOA EXPERIÊNCIA

    É bastante diferente a chamada “criação” em teatro e em arquitetura se comparada às artes de realização mais individuais. Os parâmetros que nos fazem optar pela solução, em cada caso, são na maioria das vezes, alheios aos que provavelmente seguiríamos, caso o problema nos fosse colocado em abstrato.

    As condicionantes tempo, espaço determinado e principalmente modo e preço de produção, são determinantes que nos situam no âmbito das possibilidades reais do “instante” histórico, se me permitem chamar assim, e só depois de um pouco de maturidade começamos a entender esse parâmetro como criador e ampliador e não como redutor.

    Apesar de acostumados a procurar a base do pensamento na realidade, emprestamos a ela ainda um carácter muito geral e abstrato, e surpreendemo-nos, no início, com o que ela tem de concreto e objetivo.

    A criação de uma linguagem visual dramática, assim como a criação arquitetônica tem estreita ligação com as condições que o meio social dispõe. Cabe-nos tomar esse conceito com a dinâmica que possa defini-lo, encarando essas condições como cambiantes, e nos colocarmos no sentido da sua transformação. Não fôra isso e concluiríamos impossível linguagem coerente com o pensamento atual num país infra-desenvolvido.

    O ARTESANATO É INDISPENSÁVEL

    É profundamente estimulante o fato de contarmos com maus artesãos. Que menos isso signifique seja sabermo-nos livres dos apegos convencionais à tradição romântica da marca digital no objeto útil. Apesar disso, na fase transitória à industrialização, sua falta é sensível, uma vez que a grande maioria dos métodos de produção são ainda artesanais. Esse é um dos grandes obstáculos encontrados.

    O treino do mecanismo de projetar com peças já prontas é mínimo e a falta de qualidade e a escassez das mesmas são tomadas como uma limitação absoluta e o processo é afastado.

    Para a imagem teatral que emprega o objeto pelo seu atributo, ou pelo atributo que se lhe empreste a circunstância ou a palavra, o uso de peças prontas é facilmente eficiente.

    Se tomarmos um objeto qualquer, feito para um determinado fim, e juntarmos a ele outro, o que da reunião resulta nem sempre é uma soma. Muitas vezes, e é desses casos que tratamos, o resultado é um terceiro.

    Como na imagem cênica sempre é possível dominar-se o todo e as partes, o objeto isolado pode ter um sentido mais objetivo de organização, ordenação, sistematização, uma forma de planejamento.

    O MELHOR JUIZ

    Ter  o todo como dado operacional. Ser o todo uma nova entidade que apesar de depender pode não ter relação imediata com as unidades, foi um dos dados experimentais da atual montagem.

    Trabalhar com peças prontas, eliminando grande parte do trabalho artesanal, e usar o seu atributo usual, mudar-lhe o sentido pelo conjunto ou neutralizá-lo foi outro parâmetro da nossa experiência.

    Conseguimos precisar o “neutro teatral” em oposição ao “máximo teatral” e fizemos disso a unidade cenográfica da imagem visual.

    A unidade aproximação e distanciamento estabelecidas anteriormente, carecia de aprofundamento, vindo presa a um dado mais ou menos mecânica, ou de geografia ou de psicologia.

    O teatro realista, menos ou mais abstratizado como conceito de idéias ou de palavras, tem suas raízes na simulação do cognocível inscrevendo-se na órbita das linguagens naturalistas. Seja ele simplesmente narrativo, psicológico, ou épico, é sempre dos objetos reais que parte e por meio deles que se comunica. Esses objetos mais particularizados ou mais generalizados, ganham um cunho mais próximo ou mais distante da natureza. No conjunto o conceito não chega a se inverter. O próprio teatro como objeto é a única possibilidade da extrapolação naturalista.

    Dentro do realismo teatral o emprego de um dos aspectos da realidade como fundamental é restritiva. Daí, o psicologismo ou a mera situação relativa dos objetos, ser restritivo como unidade cenográfica.

    A forma colorida, o objeto atribuído, passou a ser pensado como nova entidade. Necessário se fazia precisar seu âmbito.

    Voltando à antiga unidade aproximação-distanciamento, aplicada ao realismo teatral, entendemos o “neutro” como o mínimo desgaste, menos obstáculo ao objeto, a identidade objeto-platéia. O máximo teatral, por conseguinte, como a estrutura abstrata da contradição das atribuições usuais.

    Uma mesma cadeira, dentro de uma sala e embaixo de uma ponte empresta aos dois todos sentidos diferentes. Uma cadeira usual numa sala usual pode ser tida como “neutra”. Se embaixo de uma ponte pode ser tida como “máximo contraste”. Esses atributos surgem do sentido de usual para uma dada sociedade. Donde a unidade cenográfica depender a interrelação platéia-objeto cênico, como fator cultural.

    Da relatividade dessas possibilidades surgem os graus do “teatral” da imagem cênica. O processo não é nunca de soma, mas de síntese.

    FLÁVIO IMPÉRIO

    O MELHOR JUIZ, O REI
    (1963)