OS FUZIS DA MÃE CARRAR
(1962)

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  • REPERCUSSÃO (3/4)
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    Carlos Von Schmidt
    Folha de S. Paulo
    Fevereiro de1962

    Acervo Flávio Império

    © Carlos Von Schmidt

    OS FUZIS... – O DIRETOR

    De todas as peças encenadas ultimamente no teatro de Arena, Os Fuzis da Senhora Carrar é, inegavalmente, a que mais se prestou, a que mais se adaptou à montagem circular. Peça de pouca movimentação, sem marcações complicadas e difíceis, encontrou na direção de José Renato mão firma e vigorosa que soube conduzí-la com segurança, presteza e sabedoria. Sem preocupar-se em apresentar somente a mensagem da peça, o diretor realizou um trabalho teatral dos melhores, emprestando ao espetáculo uma unidade dramática como há muito tempo não viamos em representações em arena. Todos os elementos que compõem o espetáculo encontram-se de tal forma entrosados, que se estabelece perfeito esquilíbrio entre a forma e o conteúdo dramático. Observando com grande fidelidade a maioria das indicações do autor, sem procurar evidenciar qualquer intenção a não ser aquelas próprias ao texto, a direção mantém uma linha sóbria e discreta, conveniente e acertada em peças como Os Fuzis... completas em si mesmas. A sobriedade que caracterizou os trabalhos da direção reflete-se não só na linha interpretativa, contida e interiorizada, como também no aspecto plástico, cênico, da presente montagem. Há no conjunto geral do espetáculo uma nota dominante que é a discrição, a fuga ao espetacular, ao teatral, ao dramático bombástico e grandiloquente. Seria fácil à direção ter optado por uma ou outra linha mais espetacular, mais viva, cheia de explosões emocionais, pois o texto também se presta a esse tipo de encenação, as dificilmente o resultado teria sido o mesmo. Parece-nos que a direção achou a medida exata, o tom certo, o ritmo preciso, dando-nos uma visão objetiva e clara de todas as intenções do autor, sem esquecer o aspecto puramente teatral da peça. A abertura da mesma com um filme excelente sobre a Guerra Civil da Espanha nos pareceu das mais inteligentes, prejudicada talvez por um único senão: a narração. Por que não fazê-la da cabina de projeção, em tom cinematográfico, deixando que o filme, completo, em si mesmo, desse aos espectadores a visão trágica que contém ao invés de chamar atenção para o mesmo através de uma narração destituída de qualquer significado filmico? Por que não intercalar a narração cinematográfica com a pergunta que se faz a respeito da segurança da família Carrar? O resultado não seria teatralmente muito mais rico e a unidade que se estabeleceria entre cinema e teatro também muito mais conveniente? Outro ponto que também merece algumas considerações diz respeito ao significado que a direção emprestou a determinadas personagens como a senhora Perez e as carpideiras, de certa forma tranformadas em elementos estranhos ao contexto da trama, consideradas que foram como personagens de exceção, quando na realidade não o são.

    Mas deixaremos estas considerações para o próximo artigo quando falaremos sobre a interpretação.

    CARLOS VON SCHMIDT

    OS FUZIS DA MÃE CARRAR
    (1962)