OS INIMIGOS
(1966)

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  • REPERCUSSÃO (2/6)
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    LBL
    Jornal do Commércio
    01 de maio de 1966

    Acervo Flávio Império

    © LBL

    A Volta do Grupo Oficina e a Morte de Piscator

    O Oficina nos traz um Gorki diferente

    Tão diferentes que seus diretores sentiram-se na obrigação de explicá-lo para que o público desprevinido não corra ao Municipal, nestes 10 dias de permanência do grupo que é hoje, sem discussão, o melhor do teatro brasileiro, pensando assistir a um espetáculo faculmente compreensível à primeira vista. Ou antes, um espetáculo que todo mundo imagina estar compreendendo ao primeiro impacto emocional, mas que na verdade diz muito mais coisas do que se imagina à primeira vista. Agora é tudo diferente.

    O espetáculo, mais importante, talvez, que o primeiro, embora a peça não o seja literária e teatralmente, não será fácil para ninguém. Será preciso prestar atenção e raciocinar desde o princípio para não se perder. Estou certa porém de que todos acharão empolgante, embora muitos continuem não entendendo. Mas eis a explicação do diretores José Celso e Renato:

    “O espetáculo de Os Inimigos foi concebido como uma crônica histórica para se estabelecer as diferenças e aproximações da Revolução de 1905 com os movimentos da história recente do Brasil. Neste sentido, o espetáculo se afastou da linguagem meramente dramática cabível em Os Pequenos Burgueses, por exemplo. Nesta primeira peça de Gorki, os conflitos sociais se achavam em estado latente, e as personagens se manifestavam como psicologias e visões de mundo. Em Os Inimigos, os conflitos estão muito mais objetivados em virtude do tema de que trata a peça. As personagens não se manifestam como psicologia mas como ideologia. Sem eliminar a vida psicológica das personagens, o espetáculo se propôs a narrar com clareza os acontecimentos sociais que a peça mostra. A peça padece de uma contradição básica. A época de Gorki não dispunha de carpintaria teatral para tratar de um painel de crônica histórica. A forma vigente era a de Tchecov mais conveniente para o drama histórico vivido na consciência ou inconsciência das personagens e captada pelo espectador no seu estado mais sutil e impressionante. Ora, o conteúdo de Os Inimigos é nitidamente político e social. O tema da peça não cabe na sua forma, daí a peça ser uma má peça enquanto dramática uma peça presa enquanto peça épica, destinada a exprimir um conteúdo sócio-político.

    O espetáculo procurou compensar essa contradição partindo da carpintaria teatral moderna, principalmente da forma brechtiana. Apesar de pretender um espetáculo claro em si e elucidados da realidade pelo fato de se tratar de uma experiência, propomos ao espectador alguns dados que facilitarão a leitura do espetáculo.

    Todo o espetáculo procura significar o acontecimento particular mostrado no palco, vinculando ao grande movimento da história do período.

    Assim, a Cenografia visa buscar o dado principal da pop-art, mostrando objetos reais, apresentados no seu insólito, afastados do seu cotidiano. O neio-realismo do cenário procura colocar coisas reais em cena, mas relacioná-las entre si, com os painéis, slides, música, atores, explicando essas mesamas coisas e mostrando seu caráter eminentemente histórico. Assim, tem uma função narrativa, interfere e comenta livremente a ação.

    Se manifesta principalmente pelos:

    Slides: os slides são os instrumentos por excelência da paralelização da história particular narrada em cena com a história russa. No primeiro ato os slides dão a situação revolucionária russa, que pretendia a modificação das velhas estruturas através de uma revolução liberal burguesa nos moldes da Francesa. A cena mostra Zakhar Ivanovitch, o patrão liberal, simpatizando com as camadas populares em choque com seu sócio, representante das camadas mais conservadoras.

    No segundo ato os slides falam da contemporização Da promessa do Czar de dar um regime representativo e diz da crença dos liberais na chegada ao poder pela via representativa concedida pelo Czar. Em cena, Zakhar Ivanovitch reabre a fábrica e vive um momento de trégua. Os slides mostram ainda o crescimento do movimento popular, o número de freves políticas e contam de como a burguesia embalada pelas promessas do Czar e amedrontada, principalmente com os movimentos de massas, vai passando lentamente para a oposição aos seus antigos aliados.

    Na peça, Zakhar Ivanovitch vai cedendo progressivamente aos mais retrógrados, adotando-lhes progressivamente a ideologia e termina por concordar com a vinda do exército.

    LBL

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    (1966)