O show encantado – assim foi chamado o espetáculo que entrou para a história como um dos acontecimentos artísticos mais importantes da década de 70. Rosa dos Ventos foi o primeiro de uma série de shows originados do encontro de Maria Bethânia com o diretor Fauzi Arap, com o cenógrafo/figurinista Flávio Império e com os músicos do Terra Trio.
Montado em 1971, o objetivo era cantar a volta dos brasileiros exilados, sobretudo Caetano Veloso e Gilberto Gil. O roteiro conjugava canções e textos de autores como Fernando Pessoa e Clarice Lispector. Fauzi dividiu o espetáculo em cinco blocos inspirados nos elementos da mandala jungiana: Terra, Água, Eu-difícil (o centro), Fogo e Ar. Em cada um deles, Flávio Império concebeu figurinos específicos para a intérprete, além de túnicas que representavam a qualidade dos elementos para os músicos.
Nos blocos do Eu-difícil e da Água – que, segundo Jung, remete à infância - Flávio reproduziu o vestido de primeira comunhão de Bethânia, amareleceu o tecido, desgastou-o, como se tivesse sofrido a ação do tempo. Para o Ar, elaborou uma indumentária preta com a qual a intérprete dissolvia-se no cenário da mesma cor, de forma etérea. Esta foi, aliás, a última ocasião em que Bethânia utilizou em cena um figurino preto, atendendo a uma recomendação religiosa.
A cenografia era uma espécie de não-lugar onde os elementos interpretados por Bethânia poderiam se manifestar: um palco levemente inclinado, forrado de tecido escuro, que subia pelas paredes. Havia apenas duas entradas laterais mais claras onde eram projetadas imagens - fotografias de Marisa Alvarez Lima, mandalas desenhadas por pacientes da instituição psiquiátrica Casa das Palmeiras e grafismos criados pelo próprio Flávio. O conteúdo de protesto do show passou ileso pela revista de treze censores.